- Assim que o bebê nascer, esqueça tudo o que você sabe sobre regulação hormonal do parto (o parto não acaba enquanto não nasce a placenta) e necessidades das mulheres em trabalho de parto: acenda a luz, gargalhe de felicidade pelo parto, deixe que outras pessoas entrem no quarto, fale excitadamente e sem parar com a mulher, discuta como foi legal o parto com a mulher e todos à volta, nos mínimos detalhes, incluindo horários, aspectos técnicos etc.
- Coloque o bebê sobre a mãe (você já aprendeu isso, né?), mas o enrole bastante com panos e coloque logo a touca, de modo que o contato pele a pele (estímulo para a liberação de ocitocina) não passe de um contato pano-a-pele e que aquele cheiro inebriante da cabecinha do bebê pelo qual muitas mulheres ficam completamente vidradas (estímulo para a liberação de ocitocina) fique bem encoberto pela touquinha fofa. Isso tudo pra evitar que eles congelem numa sala que não deveria estar fria, mas está.
- Fique checando sem parar se o cordão ainda pulsa (o que em tese pode fazer com que ele pare antes, se realmente houver uma resposta de vasoconstrição à manipulação excessiva do cordão, como eu acredito que há) e, assim que achar que parou de pulsar, clampeie imediatamente e tire o bebê da mãe para que ele e/ou ela possam ser examinados mais facilmente.
- Assim que o cordão estiver clampeado, passe o bebê para que alguém possa examiná-lo, limpa-lo e vesti-lo (para acabar de vez com o contato pele a pele e às vezes inclusive retirando o bebê do campo visual da mãe). Se ele começar a chorar por isso e a mãe começar a ficar angustiada ou preocupada, não se importe, diga alguma coisa reconfortante pra ela e ignore que a adrenalina (medo – preocupação – tensão) tem ação contrária à da ocitocina (necessária para a dequitação e um terceiro estágio seguro).
- Aproveite que o bebê já saiu do colo da mãe e o cordão já está clampeado e comece a cutucar, digo, examinar o períneo. Talvez, inclusive, você já possa passar uma gaze e jogar um soro ou solução (incômodo e dolorido para muitas) para verificar a extensão e profundidade de uma possível laceração ou até mesmo dar uns pontinhos (incômodo e dolorido para a absoluta maioria) para agilizar! (ciclo medo – tensão – dor manda lembranças, afinal ele só é realmente relevante durante o trabalho de parto, como você já decorou dos livros)
- Se nesse intervalo (estimo uns 15 ou 20 minutos desde o nascimento, se você foi bem ágil nos passos anteriores) a placenta ainda não saiu, comece a franzir a testa e olhar para a mulher e para o cordão pendurado para fora da vagina dela com uma cara tensa e preocupada. Balbucie alguma coisa e troque olhares com seu assistente. Balance a cabeça com cara de quem está considerando atacar, digo, intervir. Fique sempre em cima, não deixe a mulher em paz nenhum minuto, a qualquer mínima queixa dela, pergunte com o olho arregalado: É CONTRAÇÃO? ESTÁ VINDO UMA CONTRAÇÃO?
- Se estiverem vindo contrações ou se não estiverem vindo contrações, comece a checar sem parar o útero. Aproveite pra massagear vigorosamente, tracionar o cordão, sem nunca esquecer de reforçar que tudo ali é um perigo e que é preciso estar atento e forte, já que uma hemorragia (fale essa palavra) pode acontecer a qualquer minuto. Comece a trazer materiais para perto dela. Tilintar de ferros seria excelente nessa fase.
- Se o bebê estiver já vestido e penteado, além de bem enrolado em mantinhas coloridas, traga-o para perto da mãe, já que você aprendeu que é importante colocar o bebê ao seio se houver uma preocupação com a retenção da placenta (diga essas palavras também, com a testa franzida). Como você está cutucando a mãe sem parar, talvez ela não queira ficar com o bebê no colo, mas você, muito diligente, diz pra ela que ela PRECISA botar ele ao seio.
- Nesse ponto, você recrute alguém (doula ou assistente ou pediatra) para colocar o bebê ao seio materno efetivamente. Mesmo que ela não deseje ou mesmo que ele não deseje e chore e recuse. Diga que é fundamental que ele mame AGORA para ajudar a PLACENTA RETIDA a sair e evitar uma HEMORRAGIA. Tudo isso de forma incisiva, para a mulher ficar bem nervosa a cada vez que ela não conseguir e/ou o bebê chorar no peito.
- Se tudo isso tiver funcionado, o terceiro estágio já estará todo bagunçado e você já terá comprometido a famosa “hora de ouro” (a primeira hora pós-parto em que o bebê e a mãe devem passar pelo imprinting, pelo reconhecimento, além de aproveitarem o nível máximo de ocitocina circulante que têm em seu organismo para que todas as adaptações necessárias aconteçam de forma tranquila e segura). Nesse momento, provavelmente já terá se passado a primeira hora e você terá, oficialmente, uma retenção placentária em curso. Talvez até uma leve atonia uterina e um sangramento aumentado. Pronto! É chegada a hora de você intervir de forma eficaz e imediata para corrigir esses processos patológicos que você mesmo causou. Parabéns!
Fonte: Aqui
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